Taxa de Turismo em destinos brasileiros: cobrar ou não?

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Nos últimos dias, li a notícia em alguns jornais: Caldas Novas - um destino nacional em Goiás, destino termal conhecido por um turismo de massa - acaba de aprovar a cobrança de taxa de turismo a partir de 2025 (Folha de SP, Metrópoles, Correio Braziliense).

Em uma das reportagens, é dito que a população de Caldas Novas e turistas estavam revoltados com o fato. Revolta ligada ao receio de reduzir fluxos, consequentemente, renda e ocupação dos empreendimentos hoteleiros. Quiçá também ligada à falta de clareza do que a taxa pode fazer pelo ordenamento do destino.

Já observamos modelos em teste em diferentes localidades. Veneza, um destino turístico global ícone do overtourism (turismo excessivo, desequilibrado), instituiu uma taxa de visitação para manejar seus fluxos. Ela varia entre 5 e 10 Euros, é cobrada por pessoa que acessa a cidade e que não pernoitará, a ser paga para visitação em datas e horários específicos, com calendário publicado no ano anterior. Em 2024, foram angariados mais de 3 milhões de Euros nos 29 dias de duração da cobrança. Para 2025, serão 59 dias a serem cobrados em dias de picos de fluxos (as dúvidas são respondidas neste FAQ muito simpático, a propósito, com explicações de moradores).

No México, o estado de Quintana Roo, onde fica Cancún e outros destinos com alto fluxo, cobra uma taxa de USD 17 por estrangeiro que visita a localidade. A explicação: "a world-renowned destination that attracts millions of visitors each year and, as such, requires significant investments to support its growth and ensure a positive experience for all visitors" (um destino que atrai milhões de turistas por ano requer investimentos significativos para apoiar seu crescimento e garatir uma experiência positiva para todos os visitantes, tradução livre).

No Brasil, Fernando de Noronha (PE) é o local mais conhecido pela cobrança, que ocorre desde 2004 aos turistas que visitam o arquipélago. Também Bombinhas (SC) e Jericoacora (CE) são alguns destinos nacionais que já possuem taxas de turismo para a preservação local. Em Bombinhas, a cobrança é feita por veículo que acessa a localidade, apenas durante o verão (de novembro a fevereiro). Em Jeri, a taxa é cobrada por pessoa para estadias de até 10 dias, sendo necessário pagar adicionais a cada dia de permanência. Bonito (MS) irá iniciar a cobrança em 2025, com o valor de R$ 15 reais por dia que os viajantes passarem no destino.

A taxa de turismo - chamada em alguns lugares de TPA (Taxa de Preservação Ambiental) - é um instrumento econômico que permite estimular ou desestimular comportamentos.

Vou te explicar porque a taxa pode ser positiva, preocupações e indicar alguns aspectos a serem observados para que ela possa reverter em resultados positivos para o destino.

A taxa é positiva quando...

Permite gerenciar melhor os fluxos, dentro da realidade de cada destino. E quando permite que o destino viabilize investimentos para ações que ajudam a preservar seus atrativos, melhorar a qualidade de vida da população e da experiência do turista, mitigar os prejuízos gerados pela visitação excessiva. Ou seja, pode ser uma agregada na busca por equilibrar visões e implementá-las dentro do destino.

Se utilizada para gerar benefícios coletivos, a taxa é positiva. Exemplos de investimentos: despoluir uma nascente, melhorar a brigada contra incêndios florestais, fazer plantio de árvores em espaços públicos, implantar uma ciclovia, aumentar a acessibilidade das calaçadas, instalar gestão de resíduos com foco na economia circular, promover educação ambiental, implementar práticas de segurança em atrativos, fomentar práticas regenerativas de turismo, fazer pesquisas e estudos sobre os impactos do próprio turismo e por aí vai.

Preocupações para termos em mente

A primeira delas é a elitização excessiva do destino, ou seja, o encarecimento da visitação a ponto de receber apenas quem tem um poder aquisitivo muito alto, gerando exclusão de uma parte expressiva da população. Outra preocupação é a falta de clareza: para onde vai o dinheiro, com que ele é gasto, quem decide isso, cadê os benefícios?

O que é preciso garantir para que a TPA faça sentido:

  • Ser participativa: a comunidade precisa participar da definição do uso do recurso, de acordo com prioridades. Onde estão os maiores prejuízos causados pelo turismo? Onde seria prioritário e mais visível este benefício? A comunidade é formada por vários grupos - alguns ligados diretamente com o turismo e outros não. Todos precisam ter espaço de escuta e participação. Após resultados observados, provavelmente as preocupações iniciais de que a taxa prejudicou o destino serão abandonadas.
  • Ser transparente e com governança forte: as pessoas da comunidade - moradores, empreendedores, etc - precisam saber quanto foi arrecadado e como o recurso foi utilizado. Relatórios periódicos, audiências públicas, prestação de contas são fundamentais. Além disso, as regras pactuadas de investimento do recurso devem estar claras e serem auditáveis para evitar desconfiança e corrupção. Com clareza de aplicação do recurso, o instrumento ganha legitimidade.
  • Ser factível de implementar e de fiscalizar: há destinos que decidem cobrar taxas sem definição prévia de quem cobra, como arrecada, quem fiscaliza, como paga. Isso faz com que o instrumento seja fadado a fracassar. Ou cai em desuso, ou não serve para o que se propõe. Essas questões precisam estar respondidas na regulamentação local. Precisa haver atenção também para que os mecanismos de operação da taxa não sejam tão caros que superem a arredação da própria taxa - os famosos custos de transação superiores aos resultados.
  • Ser coerente com os comportamentos a serem premiados: o destino precisa conhecer seus pontos desafiadores e que comportamentos quer estimular de antemão. Isso serve para decidir como serão as isenções, os valores e as cobranças. Se eu quero estadias mais longas, preciso premiar este comportamento. Se eu desejo que as pessoas fiquem por menos tempo, posso elevar o preço para estadias mais longas. Por exemplo, não teria sentido eu "premiar" com isenção aqueles que não pernoitam na cidade se este público tende a causar mais impactos negativos e menos impactos positivos na sua localidade. Cada destino precisa ter sua própria avaliação de necessidades.
  • Ser favorável a uma boa jornada do turista: é preciso ser fácil e simples seu entendimento e pagamento. O turista precisa da informação com antecedência para se preparar, compreender e, preferencialmente, ser estimulado a comportamentos adequados naquele destino. Radares, sistemas fáceis, tecnologias distintas podem ser aplicadas para isso. Ninguém deseja um turista em uma fila na hora de chegada, acessando um sistema pouco amigável, que não aceita o meio de pagamento que ele tem ou que não fale o idioma dele para pagar uma taxa. Ou seja, a interação para o pagamento da taxa também fará parte da experiência dele no destino.

Helena Costa

Helena Costa

Cofundadora e pesquisadora do LETS/UnB. Professora Associada VI - Departamento de Administração da Universidade de Brasília. Doutora em Desenvolvimento Sustentável. Mestre em Turismo. Administradora.
Brasilia, Brasil