Constata-se que a sustentabilidade nunca foi tão pleiteada como nos dias de hoje. Ações nesse sentido são demandadas para uma sociedade mais justa que prime pela preservação do meio ambiente e que considere e defenda uma maior justiça social.
Nesse contexto, há uma congruência entre o turismo sustentável e o responsável, na medida em que ambos se baseiam em três pilares:
- ambiental (preocupação com o gerenciamento no uso e impacto nos recursos naturais, educação e informação ambiental, na construção de fortes parcerias);
- social (preservação cultural e patrimonial, envolvimento da comunidade, melhoramento dos serviços e infraestrutura, melhoramento da qualidade de vida); e
- econômico (aumento da empregabilidade do setor, lucratividade do negócio, entre outros).
Especificamente, o turismo responsável, por meio da Declaração de Cape Town, datada de 2002, preocupa-se, explicitamente, com a acessibilidade, no momento em que são definidas as suas características ao se mencionar que os destinos “devem proporcionar acesso às pessoas com deficiência”. Obviamente, se analisados os três pilares mencionados anteriormente, constata-se um enquadramento maior no pilar social, na medida em que se busca um aprimoramento dos serviços e na infraestrutura local, no envolvimento da comunidade e no melhoramento da qualidade de vida. Todos esses aspectos devem ou deveriam pressupor a inclusão das pessoas com deficiência.
Da mesma forma, observa-se uma maior relação com o pilar econômico, já que o aumento da empregabilidade do setor pode também, deve ou deveria incluir o emprego de pessoas com deficiência, incrementando o envolvimento dessas pessoas no setor. Dessa forma, as pessoas com deficiência se sentiriam, de fato, incluídas, entendendo que o turismo também poderia ser benéfico para elas, seja no usufruto dos serviços, seja por meio da empregabilidade, ambos ocasionando a inclusão social dessas pessoas, que se sentiriam ativas por meio das atividades relacionadas à área.
Nessa mesma perspectiva, o documento “Transformando o Nosso Mundo: Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável” ( ONU, 2016), assinado pelo Brasil em 2018 confirma a importância da acessibilidade principalmente nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 10 e 11.
No objetivo 10:
empoderar e promover a inclusão social, econômica e política de todos, independentemente da idade, gênero, deficiência , raça, etnia, origem, religião, condição econômica.
E no 11:
proporcionar o acesso universal a espaços públicos seguros, inclusivos, acessíveis e verdes, particularmente para as mulheres e crianças, pessoas idosas e pessoas com deficiência.
Tal realidade denota uma congruência com o principal objetivo do turismo responsável que é “criar, primeiramente, lugares melhores para as pessoas viverem e para as pessoas visitarem”. A partir desse objetivo, questiona-se: como um lugar pode ser considerado um destino com um turismo responsável se não atende aos requisitos mínimos de inclusão das pessoas com deficiência, sejam elas turistas ou moradores locais? Será que esse local poderia ser considerado, de fato, um destino que pratique ou ofereça um turismo responsável? Verifica-se que quando se aborda a questão do turismo responsável ou sustentável, em ambos há um peso maior no pilar ambiental, deixando em segundo plano o social, principalmente no quesito da inclusão das pessoas com deficiência quando, na verdade, isso deveria ser um pressuposto
Da mesma forma, no turismo em linhas gerais, quando há uma preocupação com a inclusão dessas pessoas no setor, a ênfase primeiramente recai sobre os turistas com deficiência e pouco se fala sobre a empregabilidade no trade turístico. Mesmo a legislação atuando em favor para uma maior empregabilidade, de fato, há ainda um longo caminho a ser percorrido para que as pessoas com deficiência tenham os seus direitos garantidos no que se refere ao seu espaço social.
Levando em conta todos os fatos abordados anteriormente, questiona-se se a palavra “sustentável” ou “responsável” deve ser utilizada para um destino que não se preocupa com a inclusão das pessoas com deficiência, sejam elas turistas ou moradores. Assim, considera-se que não deveria existir turismo responsável ou sustentável sem acessibilidade, pois acredita-se que esse turismo não é, de fato, responsável ou sustentável.
Partindo desta compreensão, e uma vez identificada a necessidade de correlação entre os temas acessibilidade e sustentabilidade, há que se refletir sobre a transversalidade da acessibilidade no âmbito dos destinos turísticos, que muitas vezes se apresenta como um requisito isolado no processo do planejamento turístico, desarticulado nos programas e projetos de turismo do Brasil.
Vale ressaltar ainda que, a acessibilidade influencia na escolha do destino, impactando na atração de fluxos e na competitividade. Por isso países de todo o mundo têm investido fortemente neste requisito. A Grécia por exemplo investiu 15 milhões de euros para garantir a acessibilidade para pessoas com deficiência, mobilidade reduzida e idosos em suas praias através do Programa Operacional Competitividade, Empreendedorismo e Inovação.
No contexto nacional, é possível constatar, ainda que timidamente, avanços sobre essa discussão. No campo da pesquisa, a Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Turismo (ANPTUR), após 20 anos de sua existência, criou o GT- Acessibilidade e Inclusão em Turismo, que pela primeira vez debaterá em profundidade temas como este no XX Seminário ANPTUR, no Rio de Janeiro, em setembro próximo. Mesmo sabendo que temos um longo caminho pela frente, para nós pesquisadoras da área, foi uma grande conquista. Assim, esperamos contribuir com uma reflexão que promova a igualdade de oportunidades para todas as pessoas.
Que tal você também refletir sobre isso?